Os pais procuram ser amados pelos filhos
e isso muitas vezes atrapalha a espontaneidade do gesto”1

A psicóloga Fátima Fontes diz que, imaginar que os pais são os melhores amigos dos filhos é uma “doce ilusão”, pois os melhores amigos de nossos filhos são escolhidos por eles conforme a faixa etária ou afinidades.
Mas, é possível ser amigo de verdade de um filho, uma vez que todos os que se aventuram no desafio da paterno-maternidade cometem erros que nem sempre são perdoados por eles? Segundo a “parábola do filho pródigo”, contada por Jesus sobre a relação entre um pai e seus dois filhos e registrada em Lucas 15.11-32, parece que sim. Nela encontram-se algumas marcas essenciais para uma amizade duradora entre pais e filhos. Essas marcas parecem predominar mais nos pais que nos filhos.
1. Perceber e respeitar as inquietações dos filhos (V.12 e 13) – O garoto vivia uma vida confortável na fazenda do pai, mas possuía uma inquietação natural, humana, de descobrir o que havia do lado de fora da porteira. Em sua juventude ousada, decidiu que correria o risco da aventura. Naturalmente precisava de dinheiro, pediu ao pai, que não hesitou em apoiá-lo no projeto, mesmo sabendo dos riscos que ele enfrentaria. O processo de amizade duradoura entre pais e filhos passa pela percepção e o respeito até das decisões equivocadas de nossos filhos. O exercício do poder para que nossos filhos façam apenas o que queremos, traz resultados imediatos, mas às vezes gera ressentimentos futuros. Uma família amiga nossa, possui uma casa muito luxuosa, com quartos privativos para cada filho e todo o conforto que um ser humano precisa. Um dia, um dos filhos simplesmente colocou uma mochila nas costas e saiu pelo mundo para uma vida incerta. Até onde sei, ainda não voltou. O Salmo 127.4 diz que “os filhos são flechas” e flechas existem para serem atiradas, não guardadas no alforje.
2. Confiar no que ensinou aos filhos (V.13 a 19) – Agora o filho está longe dos seus olhos, totalmente fora do seu controle e não há nada que ele possa fazer a não ser desejar que o garoto ponha em prática as coisas boas ensinadas em casa. É provável que o pai tenha passado noites em claro pensando onde e como estaria seu filho, pois não havia celular e muito menos WhatsApp. Será que ele estaria praticando seus ensinos ou havia cedido aos apelos sociais e as influências dos “amigos”? Uma atitude que pode promover a amizade duradoura entre pais e filhos é a consciência dos pais de que fizeram o que era possível, com acertos e erros, como todo processo pedagógico natural. Mas, é preciso ressaltar que, se houve algum excesso que os pais tenham consciência de haverem cometido, é necessário pedir perdão aos filhos para que se inicie a cura das mágoas produzidas no processo educativo. Como diz o Prof. Leandro Karnal, “educar, do ponto de vista freudiano é estabelecer pequenos traumas superáveis”.2
3. Acolher o filho, mais que seu comportamento (v.20) – O menino não sabia que a vida lá fora era tão dura, que o mundo era tão cruel. Então “caindo em si”, lembrou de seu pai e sua casa de origem e resolveu voltar. Ensaiou um discurso que é provável ter sido recitado envergonhado e cabisbaixo. Mas parece que o pai estava tão alegre com a volta do filho que nem ouviu as palavras. Ele apenas “correu para seu filho, e o abraçou e beijou”. Não lançou no rosto do filho o velho ditado com ar de superioridade: “Eu te falei que não ia dar certo”. Aquele pai era prodígio, diferente. Ele pede roupa nova para o rapaz, anel para o dedo, sandália para os pés, manda matar o novilho cevado, e convoca os músicos para tocar. Tem início a festa (v.23, 24). Uma atitude que pode promover uma longa amizade entre pais e filhos é olhar para o filho como um ser humano, uma pessoa, mais do que para suas atitudes, quer sejam certas ou erradas. Quantas vezes fui grosseiro com meus filhos porque queriam dormir na minha cama, porque derramaram suco na mesa ou deixaram uma lâmpada acesa. Eu olhava para um erro de comportamento, sem levar em conta os lindos seres humanos que o Senhor me presenteou para cuidar. Esse pai sabe amar sem ser amado e até mesmo sendo rejeitado. Ele é a figura do nosso Pai amoroso, que olha para o que há dentro de nós e não apenas o que fazemos. Conheço pais que sofrem porque seus filhos estão envolvidos com vícios e prostituição, caminhos que eles nunca ensinaram. Mas esses filhos são amados como pessoas, apesar de seus pais não concordarem com o comportamento deles.
4. Tentar não fazer acepção entre os filhos (v.25 a 31). Aquele pai amava o filho inquieto, rebelde, injusto, gastador, aventureiro e amava igualmente o outro certinho, disciplinado, obediente às normas da casa, mas igualmente infeliz. Ao se sentir preterido, o filho mais velho foi reclamar do pai com um sentimento de indignação. “Eu te sirvo, jamais transgredi uma ordem tua, nunca me deste um cabrito…”. O mais novo era ousado, atirado, mas o mais velho se sentia escravo do pai e não filho. A atitude do pai foi tentar mostrar ao filho que se sentia preterido, que ele era tão amado quanto o seu irmão e conscientizá-lo da sua filiação (v.31). Quando fazemos acepção entre nossos filhos corremos o risco de magoá-los e construir uma barreira que pode afetar essa amizade. Quando tratamos todos os filhos com amor, a possibilidade de uma amizade duradoura é maior.
Pais e filhos, amigos para sempre? Sem querer ser a última palavra no assunto, cremos que sim, desde que entendamos que crianças e jovens são inquietos, cheios de expectativas e sonhos em relação à vida, que façamos o melhor pela educação dos nossos filhos, olhemos para eles como seres humanos que acertam e erram e finalmente não façamos acepção entre eles. Seguindo esses passos é possível que tenhamos nossos filhos como amigos para sempre.


1 - http://superfrases.net
2 - Notas pessoais de uma palestra assistida pelo Youtube, que não lembro o título,
apenas o autor.