Podia ouvir meu coração batendo forte enquanto ouvia aquela mulher falar de suas dores e lutas como mãe, mulher, pastora e esposa de pastor. Chorei com ela e por ela! Como não chorar junto com estas mulheres líderes que cuidam de tantas pessoas e se sentem tão solitárias e sem cuidado.
Nesta caminhada mobilizando mulheres em liderança, pastoras e esposas de pastores para a vivência do cuidado mútuo, percebo que o cuidar de quem lidera e cuida de outros é possível de ser interpretado a partir de diversos lugares e olhares. O cuidado, precisa acontecer em todos os âmbitos da vida, seja na relação consigo mesmo, seja na relação com os outros ou ainda na relação com o mundo. Lembrando de que ao cuidar e sermos cuidados é que descobrimos quem (seria isto?) somos, pois, amar a Deus, ao próximo e a si mesmo é nossa tarefa existencial como cristãos.
Podemos pensar em cuidado do cuidador a partir de diferentes propostas. Uma possibilidade poderia ser, a partir de uma iniciativa das instituições, denominações ou organizações com as quais os cuidadores estejam vinculados, a criação de estratégias de grupos ou redes de cuidado ou pastoreio para seus pastores, pastoras e cônjuges. Ao mesmo tempo entendo, que se não houver uma atitude consciente da importância do cuidado de si por parte de cada pastor, pastora e cônjuges, as iniciativas institucionais serão somente mais uma regra institucional a ser seguida sem expressão de cuidado efetivo. Faz-se necessário que cada líder pastoral passe a assumir a responsabilidade do cuidado de si, do seu próximo e de seu mundo como tarefa compartilhada. Cada líder pastoral precisa ser proativo em buscar construir sua rede de cuidado. Esta rede de cuidado poderia ser composta por um grupo de pastoreio ou cuidado mútuo, um discipulador, um mentor ministerial, um mentor para seu casamento ou para outra área de sua vida. Importa que cada um tenha a sua rede de cuidado conforme as suas necessidades e a sua realidade! Precisamos de espaços e relacionamentos que promovam cuidado! Amar a si mesmo e ao outro é também cuidar de si mesmo para poder cuidar bem do outro!
O cuidar é uma questão complexa e que envolve uma série de fatores de ordem subjetiva que muitas vezes são ignorados. Cuidar é mais do que um ato: é uma ação contínua. Portanto, abrange mais que um momento de atenção e de zelo. Representa uma atitude de ocupação, responsabilização e envolvimento afetivo com o outro. O pastor, a pastora ou mulher em liderança, enquanto cuidadores e necessitados de cuidado, devido ao trabalho inerente ao seu ofício, estão sujeitos a uma série de conflitos e possibilidades. Conflitos estes inesperados e que na maioria das vezes não se está preparado para lidar. Portanto, pastoreio mutuo, mentoria, discipulado são expressões de cuidado que todo homem ou mulher em liderança precisa experimentar.
Quando estamos liderando, pastoreando, cuidando de outros/as e não experimentamos cuidado significativo ou pastoreio na nossa vida, as nossas necessidades não estão sendo satisfeitas.
A psicóloga Ana Cristina Limongi França e o psiquiatra Avelino Luiz Rodrigues falando sobre stress no trabalho pontuam que, frente a estressores psicossociais, notadamente quando suas necessidades não estão sendo satisfeitas, o indivíduo tende a “ajustar-se” basicamente de duas maneiras:
a) Através de um ‘ajuste ativo’, pelo qual expressa o seu desejo de mudança da estrutura à qual está submetido; busca encontrar alternativas para solucionar as pressões, além de rever seus posicionamentos, na procura de um redirecionamento no seu fazer profissional;
b) Num processo nomeado de ‘ajuste passivo’, passando a depreciar o trabalho e senti-lo como um peso e não como fonte de satisfação. Nesta situação o ministério pastoral torna-se uma obrigação, pois, o pastor ou o líder perdeu a paixão pelo mesmo. O objetivo torna-se apenas a remuneração, levando o trabalho a ser sentido como desinteressante, não envolvente e sem gratificação alguma. Este processo promove um movimento para fora do trabalho, levando o individuo a buscar afastar-se da sua relação laboral, em busca de realização em outros locais e situações. Uma vez que não se pode desligar formalmente, devido principalmente, a questões de ordem econômica e financeira, o indivíduo, em busca de alívio temporário, começa a se ausentar do trabalho com frequência, além de se tornar vulnerável para o desenvolvimento de doenças.Tais ocorrências, em se tratando de um pastor, pastora ou líder, podem conduzir a um esvaziamento quase total do que se constitui o seu maior ofício: o cuidar!!!
A figura do pastor, da pastora, esposa de pastor é permeada por uma forte representação e expectativa social de um comportamento idealizado. Neste sentido, ao falarmos acerca do sofrimento e do cuidado de quem cuida de outros é importantíssimo que se tenha em mente também um outro fator que pode ser um impedimento para a busca de cuidado: A impossibilidade de se conjugar o ser cuidador de outros e ao mesmo tempo buscar ou necessitar de cuidado, partindo do pressuposto que estes dois aspectos excluem-se. Ou seja, para muitas pessoas se eu sou um cuidador, em tese, não sou ou não posso admitir-me como sendo também alguém que necessita de cuidado.
Muitos homens e mulheres que lideram assumem para si as expectativas irreais da igreja local, da sua denominação ou do seu cônjuge e assim, adoecem por não conseguirem corresponder as tais expectativas.
Precisamos de espaços e ambientes onde na Graça, somos acolhidos e podemos reconhecer e expressar as nossas vulnerabilidades enquanto homens e mulheres que cuidam e que necessitam de serem cuidados. “Sozinhos Não”!